Nunca falou-se tanto da necessidade de encontro. O teatro, repetem incansavelmente diretores e atores, é um local de encontro, sagrado às vezes, em meio à correria do dia a dia; as redes sociais propiciam encontros fascinantes, embora fluidos em sua frivolidade, impensáveis há alguns anos, e reencontros quase impossíveis com quem se havia perdido o contato; segundo um consenso coletivo informal, os espaços públicos têm que ser tomados mais e mais com grandes movimentos espontâneos, sem motivo evidente senão o próprio encontro; as agências de namoro, os sites, blogs, as igrejas pentecostais, todos querem propiciar algum tipo de encontro.
Mesmo o estado tenta dar conta dessa demanda por encontros, embora na maioria das vezes atue mesmo é como bombeiro. Os telefones, os celulares, o skype, o MSN permitem que se fale com várias pessoas ao mesmo tempo, potencializando os encontros. Parece haver um acordo planetário para que nos encontremos mais e mais, sempre, claro, pautados por plataformas pré-definidas, onde cada clique nos localiza geográfica, econômica e culturalmente, fazendo subir as ações desta ou daquela empresa.
No entanto, quando antes as conversas foram tão truncadas por tanta publicidade, por tantas mensagens, por outro chamado telefônico, por novos e velocíssimos encontros? Nos desencontramos rapidamente com amigos que não víamos há meses no lançamento de um livro, ou em um show; nos desencontramos indo de um palco a outro da virada cultural, entre fragmentos de inexpressão verbal; nos desencontramos na conversa rala e efusiva durante a ponte aérea Rio-São Paulo; nos desencontramos no entrecruzamento dos círculos de amigos, conhecidos, familiares do google +, nos desencontramos nas festas, nos bares, nos cafés, na cama, rapidamente, pele com pele, para voltarmos a mergulhar cada um em seu ritmo desenfreado de doces agonias; e nos desencontramos principalmente nas redes virtuais, reduzidos a um polegar positivo, a uma curtição, a um toque, a um parabéns, a um compartilhamento de nada vezes nada para o galáctico nada.
E culpamos o tempo, reduzindo-nos com docilidade à rala linha do tempo do facebook, onde não cabem as delicadezas da subjetividade, muito menos seus temores, onde não cabem sequer as alegrias sem sentido que nos movem nessa ou naquela direção, gratuitas como a laranja que se colhe do pé, como o miolo do pão ou o toque das línguas no beijo. Culpamos a falta do mesmo tempo que jogamos fora com uma desenvoltura e uma sem-cerimônia que deveria nos espantar, se é que estamos vivos - vivos do eterno espanto de viver.
O que está em curso, nesse caótico emaranhado de fluxos, é uma desagregação violenta. Quando os amigos não têm mais tempo para os melhores amigos, quando o amor não tem mais tempo para se dilatar preguiçosamente no corpo infinito do amado, quando se deixa de dedicar tempo para o aprofundamento dos prazeres que mais nos movem, quando se politiza tudo por razões sociais, da arte até a mais íntima intimidade, são mínimas as chances de nos encontrarmos pra valer.
Como antes e sempre, vivemos nos desencontrando, mas agora por excesso de encontros, ou melhor, pelo excessivo desejo de encontrar, pouco importa quem, onde ou por quanto tempo. Preferimos viver no fluxo vertiginoso dessa cadeia aparentemente infindável de encontros e mais encontros. É fake.