quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Tudo o que voa
Nanquim
Explorar o mesmo tema com materiais e técnicas diferentes é um prazer para a cognição. Aquilo que a colagem diz, o desenho não pode dizê-lo. A primeira é rica em associações, a segunda em rarefação e delicadeza. Respira-se menos com o desenho, mas mais essencialmente. A colagem é um jogo. A força que uma tela pode expressar, sua densidade material, como dizê-la com a fotografia. A fotografia traz o mundo para a epiderme. E o prazer de tocá-la, com os olhos, em tudo é diverso do prazer de tocar, ainda com os olhos, a materialidade de uma tela. Percorrer esse trajeto, investigando o mesmo tema, é uma de minhas alegrias. Desejaria que ele fosse capaz de dizer o que eu não.
Caderno 38
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
Caderno de Ateliê
domingo, 22 de novembro de 2009
Entrevista com FELIPE HIRSCH
Felipe, o teu trabalho lota as platéias do Rio, aqui em Curitiba ele atrai principalmente o público jovem, ligado ao universo pop, como em São Paulo, acredito. Agora você é cobiçado por atores de repercussão nacional, como Nanini, Renata, Marieta, Andréa Beltrão, Xuxa Lopes, e outros tantos. Mesmo a crítica recebe bem teu teatro. O que há em teu trabalho que agrada tanto?
Em 1993, lá no começo da Sutil Companhia de Teatro, eu sentei com o Guilherme Weber e com a Érica e nós formamos um núcleo de criação de espetáculos, não um grupo de atores. Geralmente você forma grupo de atores, você tem 20 atores e aí nunca pode montar um Tchecov, porque tem toda aquela garotada pra encaixar. Você não pode montar espetáculos com pessoas mais maduras. Então eu trabalho com as mesmas pessoas desde 1993, com o mesmo iluminador que é o Beto Bruel, com trilha sonora do Rodrigo E. Ferreira. Até os técnicos de luz, som, todos me acompanham desde 1993. Nós formamos um núcleo de criação de espetáculos, de idéias de espetáculos e convidaríamos, desde que houvesse interesse, atores pra participar dos nossos projetos. Essas pessoas que estão se aproximando do nosso trabalho nunca me pediram pra eu dirigir um texto que já não fizesse parte do meu repertório de projetos.
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Mas isso não é comum.
Não, normalmente o ator chega e diz eu quero fazer Ricardo III, você dirige? Isso aconteceu comigo. Esse ano me chamaram pra três Tio Vânia. Eu nunca aceitei, mas não teria nenhum problema, seria Tchecov, que eu amaria dirigir. Parte da atração do meu teatro se deve a esses projetos. E felizmente existe um resultado de espetáculos com qualidade. Quando eu estou trabalhando com a Renata Sorrah, a Andréa Beltrão, Nanini, eu estou trabalhando na verdade com um núcleo chamado Sutil Companhia de Teatro. Eles estão agregados a uma idéia e a um projeto nosso.
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E as platéias do Rio, de Curitiba, São Paulo, como elas se comportam?
Há uma diferença bastante grande entre essas três cidades. O Rio de Janeiro é uma cidade muito cansada em termos de teatro. Ela viu tudo. Por isso eu gosto muito do Rio. O Rio é uma cidade pouco inocente. Minha tia, que morava na Tijuca, assistiu os comediantes fazendo Vestido de noiva, no Municipal. Mesmo as pessoas que não tinham ligação com teatro assistiam Ziembinski. Então chega uma hora em que aquilo de alguma maneira cansa. O Rio é muito calcado na novidade, na mídia, e ao mesmo tempo existe um público razoavelmente cansado disso. Quem se agita em volta dessa mídia são os próprios artistas e alguma parte mínima do público. É uma característica do Rio a gente ter um público bem mais velho. A gente brinca, quando a gente faz espetáculo parece que nevou na platéia.
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Enquanto que em Curitiba e São Paulo...
Existe um ponto muito feliz em Curitiba, que é o fato de a gente realmente estar formando uma platéia jovem. Sem nenhum tipo de hipocrisia acho que a Sutil Companhia de Teatro conseguiu formar um público pros nossos espetáculos. A gente tem um público bastante jovem, a gente consegue lotar salas aqui mesmo com todas as dificuldades. E São Paulo já é outra coisa. Em São Paulo parece que você tem público pra tudo, pra todas as regiões, pra todas as histórias.
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Uma das expressões mais presentes nos programas das tuas peças, e encampada pelos jornalistas, é 'narrativa de memória'. Ela representa o veio principal do teu trabalho?
Até então, sim. Eu não sei o que será o futuro, mas vou estar marcado pra sempre por isso. A narrativa de memória criou uma nova dimensão pra dramaturgia mundial. Do que os livros chamam de clássicos da memória - Tenneessee Williams, Arthur Miller, O'Neill - surgiu uma nova mentalidade pra dramaturgia feita na segunda metade do século. Ela criou uma nova dimensão na maneira de contar uma história, não mais thecoviana só, do tempo gota-a-gota. Existe uma dimensão que a memória cria de velocidade, de tempo-espaço dentro de uma obra. Isso trouxe realmente uma nova linguagem pra narrativa teatral. E criou uma nova dimensão também, proustiana, de você estar podendo inventar e manipular a memória.
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E a atuação dos atores dentro dessas narrativas de memória?
Há um choque entre o que eu peço aos atores, que é uma atuação naturalista, e a narrativa de memória. Porque quase sempre eu trabalho com uma vertente bastante tradicional, tchecoviana, stanislavskiana, que é o naturalismo. Isso é até comum dentro da literatura anglo-saxã.
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Normalmente os artistas se interessam pelo tema da memória com uma certa idade. Como isso foi acontecer com alguém que só agora chegou aos 30?
Não sei, eu nasci nostálgico. Sei que a juventude traz as maiores experimentações de sentido. Depois você consegue analisar melhor, é mais maduro no raciocínio. A experiência traz uma série de valores, uma maior possibilidade de compreensão. Mas eu acho que a juventude, até porque ela está muito próxima de mim, a experimentação sensorial da juventude, os sentidos, os cheiros, esse universo todo realmente é muito rico. Ele é profundo e definitivo pro resto da nossa vida. É isso que me angustia na verdade, como ser racional e inteligente pra lidar com isso e não viver mais isso.
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Fernando Arrabal, Goethe, Bergman, Shakespeare, O'Neill, Terrence McNally, Nick Hornby, Max Frisch, Shelagh Stephenson, Donald Margulies, Nicky Silver, Paula Voguel, a lista é longa. Quando você vai chegar ao Brasil?
Eu quero trabalhar com coisas boas. E é lógico que existem brasileiros fazendo coisas boas. Mas infelizmente em dramaturgia nem tanto. Não acho que a dramaturgia brasileira seja algo bastante interessante. A gente tem um gênio, que é o Nelson Rodrigues, e vive na sombra dele, ainda. Quando acontecer de eu abrir um texto de um brasileiro e sentir que isso me movimenta como ser humano, eu vou montar. Mas não tenho a obrigação de montar porque é brasileiro. Eu estou sendo muito mais honesto montando Harold Pinter do que Ariano Suassuna. O Harol Pinter é muito mais próximo do meu pensamento do que o Suassuna.
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Então não há nenhum projeto à vista sobre algum brasileiro?
Agora aconteceu. Eu vou filmar, possivelmente leve pro teatro também, a obra do desenhista Lourenço Mutarelli, que é um cara que tem uma qualidade imensa. Já pensei muito em Memórias Póstumas de Brás Cubas, que é uma das coisas mais lindas que já li na minha vida. Mas não montei, assim como não montei Dostoievski. Um dia vai acontecer.
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Impedido de trabalhar com direção de teatro, você seria escritor?
Minha primeira opção seria ficar em casa escrevendo dramaturgia, não literatura. Eu gosto demais de teatro, sou apaixonado, tenho amor por teatro até o primeiro dia de ensaio. Depois do primeiro dia de ensaio eu tenho conflitos com o teatro. No ensaio técnico eu odeio teatro. E depois da estréia eu vivo de teatro. Mas eu realmente amo o teatro quando estou escolhendo meu projeto, à luz do abajur, quando estou lendo dramaturgia.
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Não seria um equívoco ver na exuberância audio-visual de teus espetáculos a originalidade e a ousadia, quando ela parece estar mais na proposta de uma atuação naturalista dos atores - não o naturalismo televisivo, natualmente?
Acho. As pessoas não acreditam quando a gente fala em naturalismo, porque o naturalismo foi negado, inclusive por causa da confusão com a telenovela, durante muitos anos. A busca do tempo real no naturalismo talvez seja a busca mais rica, porque a mais próxima da emoção humana. Só que eu tinha outro lado do meu trabalho, que é encantador pra platéia, as mídias, a computação gráfica, o visual. Mas eu estou colocando um xarope muito amargo no meio disso aí, que é o naturalismo. Por isso Jantar entre amigos, onde eu me desfaço completamente do visual exuberante, é um espetáculo muito mais difícil pra platéia entender. Talvez ele tenha sido meu espetáculo mais mal recebido no Rio de Janeiro.
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Em que momento você realmente teve consciência de que a história tinha que ser suspensa, que ela só tem algum interesse quando filtrada pela subjetividade?
Tive vontade de trabalhar com esse tipo de narrativa a partir de Estou te escrevendo de um país distante. Eu tinha que reescrever o Hamlet, dar uma dimensão nova à nossa montagem. Tinha essa história de que o Horácio poderia ser o narrador. Muita gente acha meu trabalho parecido com cinema por causa da projeção nas telas, mas na verdade a minha semelhança com o cinema está no roteiro. Porque eu tenho uma dramaturgia muito veloz em termos de cortes e de lugar e tempo. Há sempre uma pessoa suspendendo e guiando a história. Não é uma consciência de que deve ser feito assim, mas uma vontade de fazer assim, de poder manipular a memória. Desde que, dentro dessa fragmentação quase que obsessiva do meu trabalho, existisse um trabalho naturalista.
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Como você se vê, como um dramaturgo ou diretor?
Como dramaturgo eu ainda não me vejo pleno, porque nunca tive tempo na minha vida, infelizmente, pra parar e escrever livre de qualquer projeto. Tenho muita vontade de fazer isso, de escrever textos que independam de uma montagem minha. Por isso faço muito mais uso da adaptação, da dramaturgia sampleada, de filtros. Escrevo de uma maneira muito suja, sem acabamento.
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E como diretor, você é um inovador?
Eu sou filho de uma cultura pop, então eu falo em sampler, no que um amigo chama de bastard pop. Quando você pega várias partes do pop e começa a montar, é um filho bastardo, você não sabe quem é o pai. Na verdade eu sou um filtro. Eu me influencio por Tati, Bergman, Lourenço Mutarelli. E acho que a arte é isso hoje, não existe mais uma arte pura, a gente vive mesmo num tempo fáustico. Daí meu amor por esse mito. Não sou um inovador no sentido puro, mas também não vejo hoje artistas puros. Vejo artistas lunáticos, que vivem independente de qualquer coisa.
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Intimamente, o que mudou depois que vocês investiram, com sucesso, no eixo Rio-São Paulo? Não me refiro só ao mundo profissional.
Mudou muito. Como visibilidade muda completamente, hoje a gente pode fazer praticamente o que quer dentro do teatro. Essa facilidade não me fascina, mas me utilizo dela. A visibilidade, por incrível que pareça, também não me fascina, mas faço uso dela. Eu sempre fiz teatro, pra vinte ou pra mil e trezentas pessoas. Criar sempre foi uma coisa muito solitária. A diferença é o mercado, as pessoas se interessam pelo que você está fazendo. Meu interesse maior é criar, não é nem que as pessoas se interessem muito pelo que eu estou fazendo. Porque é uma coisa meio terapêutica mesmo. Embora eu queira muito que as pessoas assistam cada vez mais. Mas está sendo muito difícil porque Curitiba sempre foi um laboratório muito bacana pra gente, porque a gente se sentia muito sozinho aqui. E quanto menos dentro de um barco de mercado mais você tem tempo de ver o que está fazendo. Só que ultimamente Curitiba não é mais o lugar que foi durante minha juventude. Meus amigos punks já não são mais punks. Minha relação emocional com a cidade mudou. E mudando essa relação fica um vazio no lugar.
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E os atores, como é lidar com eles? Vamos supor dois tipos: aqueles que chegam cheios de vícios, tiques profissionais, e os que chegam prontos, sem problemas técnicos - um Mário Schoemberger, um Nanini...
É dificílima essa pergunta. Todos são um problema imenso. Existe desde o ator mais despreparado que se possa imaginar, que está ali só porque estava sobrando um tempo no final da tarde e aí resolveu entrar. Existem outros atores que têm muita técnica, como é o Guilherme Weber. Mas ele também contém seus problemas, como a dificuldade de ter uma verdade absoluta dentro de um tempo real. Nanini é um ator que eu chamo de lunático. É um ator que não tem técnica, desenvolveu a técnica da experiência. A vida que ele constrói é muito mais importante do que qualquer outra coisa. Só que ele constrói como nenhum outro no Brasil. Ele é o maior ator do país. Ele é o ator que tem mais vida, mais emoção.
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E os atores de Curitiba?
Mário Schoemberger é um ator com um talento imenso, mas com vícios adquiridos. Os atores de Curitiba durante vinte anos se mal-educaram. Eles acham que sabem fazer e não sabem, acham que têm experiência e têm uma experiência muito específica. Não conhecem dramaturgia, são preguiçosos, trabalham muito pouco e acham que trabalham muito.
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Os autores que te marcaram na adolescência quais foram?
Dostoievski e John Fante. Quando eu descobri John Fante fiquei tão fascinado com aquele homem, porque ele não era um beatnik, mas muito mais profundo, muito mais emocional. Ele não era um simples ítalo-americano melado. Era um cara extremamente amargo, genial, tinha raízes profundas na Califórnia. Tinha um aspecto muito mais solar, escrevia como ninguém. Eu fiquei emocionado. Era jovem, extremamente jovem a vida inteira. E o Dostoievski, quem não se tocou com Crime e Castigo não foi jovem. Embora Os Irmãos Karamásovi tenha sido minha grande experiência.
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O cenário de Daniela Thomas, as projeções sobre o filó, a performance estridente dos atores, essa riqueza expressionista toda de Os solitários se opõe claramente à simplicidade do cenário de Como eu aprendi a dirigir um carro, especialmente à performance naturalista dos atores. A raiz dessa diferença está nos textos?
Está sempre. Tudo que eu começo tem a ver com o texto dramatúrgico. Mas me interesso por diversas famílias de textos. Esses dois textos partem de idéias dramatúrgicas diferentes, e mesmo na segunda montagem de Como eu aprendi... vou respeitar isso. Os solitários é um trabalho de personalidades muito fortes, Daniela Thomas, eu, Nanini e Marieta, Deborah Colker, e o texto Nicky Silver. É como se você pegasse só cores primárias. Mas de alguma maneira a gente achou uma via. A gente conseguiu se complementar.
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Essa sua obsessão pelo tempo exato dos atores tem a ver com o desejo de ressaltar o texto, de fazer com que não se perca nada daquilo que vai nele?
Nos Solitários eu fiquei um mês e meio perdido como nunca estive. Cheguei até a ter uma certa indisposição com os atores porque às vezes a performance do humor estava mais engraçada do que o texto dizia. E as pessoas logicamente falavam, Felipe, você é um louco, você tem o Nanini subindo pelas paredes e isso é muito mais interessante. E eu falava, não, eu quero que o texto seja escutado. A Daniela falou assim, por que você não coloca eles sentados o ensaio inteiro. E eu coloquei, fazendo quase que uma leitura de texto. Quando acabou essa leitura eu falei, vocês notaram que é muito mais engraçado assim do que vocês fazendo. E aí estendi um longo discurso sobre o quanto o ator às vezes nubla o texto. A gente tem que fazer pelo menos um passo a frente da literatura, senão eu fico em casa lendo esse texto. Eu quero escutar um texto, quero o ator sempre servindo à idéia do texto.
..p
O texto dos Solitários exigia o tom exato de representação, porque ele é muito forme, mas muito engraçado também.
Eu vou contar um segredo. Em dado momento, quase saí da peça, quase chamei outro diretor. Eu tive um conflito muito grande, porque a Marieta exigia que ela tivesse um performance histriônica do tamanho do Nanini. Ela falava assim, puxa, eu vou fazer duas mães, o Nanini vai fazer um garoto, uma menina, etc. Levei um mês e meio pra descobrir como eu gostaria de escutar aquele texto. A gente começou desde uma coisa mais histriônica até a mais naturalista. Fiz todas as camadas pra ver o que se encaixava dentro daquele tipo de narrativa.
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E os próximos projetos?
Agora são dez anos da Sutil Companhia. Além de um site bilíngüe sobre a companhia, a gente vai fazer uma revista com várias críticas sobre nossos espetáculos, fotografias. Vamos fazer a remontagem de Estou te escrevendo de um país distante. Vou fazer a última temporada de A vida é cheia de som e fúria, só no Rio de Janeiro. E um espetáculo novo chamado A última mensagem do cosmonauta para a mulher que ele um dia amou na antiga União Soviética, que é de um escocês de 30 anos de idade. Fala sobre comunicabilidade de um jeito muito original. Isso comemorando os dez anos. Aí faço A Morte do Caixeiro Viajante, com o Nanini, faço no segundo semestre a segunda montagem de Como aprendi a dirigir um carro. E tenho um convite do Sesi pra fazer minha peça punk, que chama O que quer o Brasil que me persegue, com o pessoal do Beijo aa força. Tenho um convite pra fazer um trabalho sobre o Lourenço Mutarelli, no Banco do Brasil. E estou fechando um espetáculo com a Fernanda e com o Paulo Autran.
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Realizei esta entrevista em 2002, quando parte dela foi publicada na revista da Imprensa Oficial do Estado do Paraná – editada por Miguel Sanches Neto.
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
Variações Negras
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Paul-Émile Borduas
Desvendério
domingo, 1 de novembro de 2009
alegoria da infância
sábado, 24 de outubro de 2009
Novos estudos para Mulher à Noite
Esses desenhos foram inspirados em um negativo. Sempre olhei com atenção minuciosa a inversão de cores de um negativo. O tamanho diminuto dos 35mm contribui para acentuar ainda mais a atmosfera mágica de alguns. A dificuldade de vê-los nos mínimos detalhes faz com que eu me concentre na atmosfera, na impressão visual que eles provocam.
Agora decidi pintar a partir deles. Antes, no entanto, preciso me apropriar dos elementos que compõem cada conjunto, por isso desenho, recorto, colo. Esse procedimento faz parte de uma estratégia de apropriação. Aos poucos, em formatos sempre pequenos, manipulo as imagens, até que algo se dê. Então, e só então, ataco a tela.
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
sábado, 17 de outubro de 2009
sábado, 10 de outubro de 2009
Fecundas e arcangélicas preguiças
O título dessa tela é um verso do sempre absolutamente necessário João Cruz e Souza, o poeta para quem toda substância merece quase sempre dupla adjetivação, o que torna esfumaçado o mundo sidéreo, já que a realidade, essa moedinha de esmola, lhe foi tão escassa e amarga.
Só para um brasileiro a preguiça é a um só tempo fecunda e arcangélica. Há anos remôo o hortelã desse verso. Há anos também Juca, o dálmata, se desmaterializou - ou se espiritualizou.
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Legado
não se pinta, não se dança, não se toca.
O miolo é intraduzível,
vãs as línguas, os tratados, as biografias.
O miolo do filho na escola.
O miolo da mulher, nos olhos.
O miolo do pão, do ser ou não.
O miolo que se sente dentro,
latente, ou sobre a cidade, azul.
O miolo é nosso legado,
inútil, de nuvens em combustão.
Par de asas no breu.
do livro O Gato sem Nome
terça-feira, 6 de outubro de 2009
Observações de um Retratista
* * *
Um rosto não guarda menos tensão do que uma tourada, menos dramaticidade. Não é menos mutante do que uma nuvem; menos harmônico, misteriosamente harmônico, do que o mar. Não padece menos da euforia dos girassóis. Um rosto é o mundo - qualquer rosto.
* * *
Os olhos, no rosto, quem poderia dizer tudo que vai neles? Mesmo os olhos mais apáticos, dispensados de ver pelo cansaço, mesmo eles, assim desarmados, mostram um falso fundo. O que os olhos dizem, em silêncio, e para quem, é um enigma. Os olhos dizem, como canta um pintassilgo em pleno vôo, como giram as pás de um exaustor eólico. Dizer, permanentemente, é sua sina. Dizer dobrado, para que a ênfase não se perca, dizer siamês, para dentro e para fora.
* * *
O retrato na parede, do pai, ou o reflexo no espelho, do nosso rosto, são a pergunta de todo eu. A pergunta que todo rosto faz, mesmo quando a boca tagarela, com a cumplicidade muda dos olhos e com a teatralidade desenvolta das mãos. O rosto pergunta mesmo no caso da ignorância mais ingênua, mesmo que seu dono converse com o lugar-comum dos botões, ou conte suas moedinhas, avaro. O rosto pergunta por conta e risco próprios. Mas nunca responde. Talvez o riso seja a suspensão temporária da eterna pergunta; o choro, sua explicitação cheia de lamentos.
* * *
Não é preciso ser fotógrafo profissional para se fazer um bom retrato - há para o rosto um limite estreito de dissimulação. Basta abrir a janela mecânica da câmera para que a pergunta entre. Os fotógrafos mais experientes, no entanto, pressentem o momento certo, quando a pergunta de um rosto vai ser formulada com ênfase particular. E põem-se à espreita, as janelas da alma bem abertas.
Trilha sonora par esta leitura: A gentleman's honor (vocal), Philip Glass (The photographer)
terça-feira, 29 de setembro de 2009
O Poema na Xícara
Emparedados
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andescente
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