quinta-feira, 31 de março de 2016

Eugenio Montale / 11


DEPOIS DA CHUVA


Ideogramas na areia molhada, 
pés de galinha. Me viro
mas onde uma ave poderá se esconder?
Talvez uma gaivota cansada, ou manca.
Nem sendo chinês para decifrar
aquela língua. Um sopro
e ela já era. Mentira que a natureza
é muda. Fala pelos cotovelos.
Tomara que ela não tagarele
demais sobre eu e você. 

Tradução de Carlos Dala Stella


DOPOPIOGGIA

Sulla rena bagnata appaiono ideogrammi
a zampa di gallina. Guardo addietro
ma non vedo rifugi o asili di volatili.
Sarà passata un'anatra stanca, forse azzoppata.
Non saprei decrittare quel linguaggio
se anche fossi cinese. Basterà un soffio
di vento a scancellarlo. Non è vero
che la Natura sia muta. Parla a vanvera
e la sola speranza è che non si occupi
troppo di noi.


Não há dúvida que algumas liberdades que se tomam ao traduzir são exageradas, mas às vezes sem esses exageros é praticamente impossível revivificar, na língua de destino, esse animal tão voluntarioso que é o poema. Avançamos o sinal também porque não conseguimos controlar completamente nossa vontade, mais ou menos idiossincrática, de meter o bedelho na criação alheia. De qualquer forma, o que conta mesmo é como o poema se comporta dentro do quadro da língua para a qual ele foi traduzido. Frequentemente as traduções de poesia mais 'fiéis' não impedem que os poema cheguem desconjuntados na nova língua. 

Foram essas liberdades que tomei ao traduzir Dopopioggia, de Eugenio Montale, acentuando certa concisão ideogramática a que o poema aspira. 


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