sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Óscar Hahn 9



Do poeta chileno, Mario Vargas Llosa disse: " A obra poética de Óscar Hahn é magnífica e verdadeiramente original, além de ser a mais pessoal que li em língua espanhola em muito tempo". 

Do livro Los espejos comunicantes, publicado na Coleção Visor em 2014, traduzo o poema Solidão, inspirado na belíssima canção de Duke Ellington. Vale lembrar que além de temas clássicos, como a solidão, o amor, a morte e o tempo, Óscar Hahn tem se dedicado cada vez mais a temas caros à atualidade, como consumismo, ecologia, energia nuclear e mesmo a celebridades da música pop, sempre com uma lucidez poética perturbadora.




SOLIDÃO

           In my solitude you haunt me
               with reveries of days gone by
                        música de Duke Ellington


Não está sozinha minha solidão:
está comigo
Onde quer que eu vá
ela vai ao meu lado
dorme em minha cama
come na minha mão: respira
o mesmo ar que respiro
Fala com minha voz
caminha com minhas pernas
sente tudo que eu sinto
Uma única vez se afastou
minha solidão
me abandonou: sumiu
Nessa tarde conheci
a mulher da minha vida
Meses e meses longe de minha solidão
Noites a fio junto a meu grande amor
ocupando o espaço vazio
de meu desamparo
Até que um dia tudo acabou
como sempre acabam
os amores eternos:
num piscar de olhos
E agora que volto para casa
minha solidão me recebe
de braços abertos
sem uma palavra
sequer uma crítica
Apenas me abraça: consoladora
e chora comigo

Tradução de Carlos Dala Stella


SOLITUDE

            In my solitude you haunt me
            with reveries of days gone by
                        Música de Duke Ellington

Mi soledad no está sola:
está conmigo
Me acompaña dondequiera
que voy: duerme en mi cama
come de mi mano: respira
el aire que respiro
Me habla con mi voz
camina como yo camino
siente lo que yo siento
Sólo una vez mi soledad
se alejó de mi lado
me abandonó: partió
Fue esa tarde que conocí
a la mujer de mi vida
Meses y meses sin mi soledad
noche tras noche con mi gran amor
ocupando el espacio
de mi desamparo
Hasta que un día todo terminó
como siempre terminan
los amores eternos:
en un abrir y cerrar de ojos
Y ahora
he regresado a mi casa
Mi soledad me recibe
con los brazos abiertos
no me dice nada
no me reprocha nada
me abraza me consuela
Llora conmigo

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Óscar Hahn 8



Sigo lendo o chileno Óscar Hahn (vencedor em 2014 do Prêmio Loewe de Poesia, na Espanha). Por dois motivos, principalmente: porque ele entra nos temas de um modo tão direto que entramos juntos, sem hesitação; e também porque mal entramos, esses temas nos afligem como se  fossem nossos. Nem a ironia, nem o insólito de algumas imagens são capazes de nos afastar de nós mesmos. Que mais pode querer um autor do que essa fusão espelhada com o leitor?


NA PRAIA NUDISTA DO INCONSCIENTE



Um homem está deitado na praia nudista
     do inconsciente
quando surgem na noite dois sóis

A metade mulher do homem corre graciosamente
     para o mar
A metade homem caminha pela orla

Na praia nudista do inconsciente
as duas metades se banham de mãos dadas

O sol negro sobe no horizonte
O sol branco desce vermelho incandescente

A mulher e o homem fazem amor até a vertigem
Seus corpos lutam sobre a areia fosforescente

E o firmamento se enche de meteoritos
que se deslocam à velocidade da luz

Tradução de Carlos Dala Stella



EN LA PLAYA NUDISTA DEL INCONSCIENTE


Un hombre está tendido en la playa nudista del
     inconsciente
a esa hora de la noche en que salen dos soles

La parte mujer del hombre corre graciosamente hacia el
     agua
La parte hombre camina en dirección a la orilla

En la playa nudista del inconsciente
las dos partes se bañan tomadas de la mano

El sol negro se alza en el horizonte
El son blanco se pone al rojo vivo

La mujer y el hombre hacen amor hasta el vértigo
Sus cuerpos luchan en la arena fosforescente

Y el firmamento se llena de aerolitos
que se desplazan a la velocidad de la luz


segunda-feira, 17 de agosto de 2015

O MAGO DO VIOLÃO



Agustín Pío Barrios Ferreyra nasceu em 5 de maio de 1885, quase certamente em San Juan Bautista de las Missiones, Paraguai. Reconhecido como o maior compositor para violão de todos os tempos, a partir de 1928 passou a usar o pseudônimo Nitsuga Mangoré; Nitsuga, Agustin ao reverso, e Mangoré como homenagem a um cacique Guarani, fuzilado por raptar uma espanhola por quem estaria apaixonado. A partir de então, para atrair a assistência, apresentou-se seguidamente paramentado como índio guarani. 

Foi o primeiro a gravar discos de violão, em torno de 40, a partir de 1915, quinze anos antes do primeiro registro de Andrés Segóvia. Além de compositor inigualável, foi intérprete genial, poeta e refinado desenhista. Depois de percorrer boa parte da América do Sul e América Central, além de algumas cidades da Europa, morreu em San Salvador, em 1944. Apesar das dificuldades de se fazer ouvir enquanto vivo, hoje Mangoré é tocado em todos os cantos do mundo, por quem estuda violão, e ouvido com o mesmo misto de reverência e espanto com que se ouve João Sebastião Bach.  


O BOÊMIO


Como giro rápido! Sou cata-vento,
movido pelos impulsos do destino
vou dançando em louco torvelino
planeta afora, junto aos quatro ventos.

Em mim, no cerne de uma vida inquieta,
vai este vagar incerto e peregrino
e a arte alumiando o caminho
como facho de um fantástico cometa.

Sou irmão em glória como em dores
daqueles mesmos medievais trovadores
que padeceram romântica loucura.

Como eles, quando eu estiver morto,
só Deus sabe em que distante porto
encontrarei minha áspera sepultura!

Tradução de Carlos Dala Stella


EL BOHEMIO

Resultado de imagem para agustin barrios mangore!Cuán raudo es mi girar! Yo soy veleta
Que moviéndose a impulsos del destino
Va danzando en loco torbellino
Hacia los cuatro vientos del planeta.

Llevo en mí el plasma de una vida inquieta
Y en mi vagar incierto, peregrino,
El Arte va alumbrando mi camino
Cual si fuera un fantástico cometa.

Yo soy hermano en gloria y en dolores
De aquellos medievales trovadores
Que sufrieron romántica locura.

Como ellos, también, cuando haya muerto,
!Dios solo sabe en qué lejano puerto
Iré a encontrar mi tosca sepultura!

Agustín Barrios Mangoré






quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Emily Dickinson / 4

Poucas admirações do passado continuam, duas ou três aumentam. Emily Dickinson é das que leio cada vez mais atentamente, tanto pelo mecanismo preciso e inesperado de seus poemas, como pela sua personalidade. E mais do que tudo pelo descarnado de seu olhar sobre o mundo, contrito de belezas. Basta um único de seus poemas para que eu mergulhe nesse experimento de linguagem tão conectado à vida como o próprio corpo, como o próprio sonho.  

1149

Percebi que as pessoas sumiam
Ainda criança pequena –
Viajavam para longe, supunha
Ou se mudavam para Regiões selvagens –
Agora compreendo – elas viajavam
De mudança para Regiões selvagens –
Mas porque estavam mortas
Fato velado à criança pequena –



I noticed People disappeared
When but a little child -
Supposed they visited remote
Or settled Regions wild -
Now know I - They both visited
And settled Regions wild -
But did because they died
A Fact withheld the little child -


Tradução de Carlos Dala Stella